Livro de: Zygmunt Bauman
Bens duráveis, relações duráveis,
realidades duráveis são nos dias de hoje antagônicos ao sentido de prazer,
alegria, gozo, felicidade e satisfação. É intolerável aos olhos da sociedade atual
a ideia de ter que passar anos, ou quem sabe uma vida com um bem, ou mantendo
uma relação afetiva, assim como, viver em uma sociedade sem altos índices de
mudanças.
Esperar é sinônimo de tristeza e
desprezo, viver o tédio natural da vida é ser ultrapassado, pois “tempo é
dinheiro” segundo declarou Isaac Newton. O ócio não pode mais ser criativo,
pois o ócio é maçante, sem graça, é uma característica padrão de pessoas
ultrapassadas.
Não sabem os mais “adiantadozinhos”
que o tédio natural da vida é a base da reflexão e é da reflexão que em grande
parte emanam os pensamentos que moveram o mundo no âmbito da ciência, filosofia
e da tecnologia. O ócio ainda pode ser criativo, mas se faz necessário ter
abertura, abrir a mente, dar-se tempo e sentir a vida em suas mais sublimes
facetas impressas nas cenas que vão passando e nos singelos traços refletidos
pela natureza.
Sem significado racional a vida não
permanece engajada, corremos soltos e individualizados em busca de sermos
maiores para parecermos melhores, mas o fim de tudo isso é frustração.
Observe o mundo real, um dia tudo
foi muito mais pesado e enraizado, hoje o que um dia foi pesado e fixo, passou
a ser leve e móvel, ou seja, o progresso passa pela capacidade de se abrir as
novas possibilidades sem necessariamente abandonar os princípios e essências,
talvez modifiquemos os formatos, as substancias, mas o que caracteriza valor, não.
É importante identificar os
caminhos naturais em que a vida vai se projetando, a tecnologia avança, as
formas, as cores, e até mesmo a natureza evoluem, e penso ser interessante que
a mentalidade e a forma de se fazer negócios, de empreender e de relacionar-se
também evoluam e acompanhem tudo isso, no entanto é preciso ter sensibilidade,
é preciso lançar-se ao futuro sem desprezar a leis naturais e lógicas que regem
a história. Adaptar-se, moldar-se não são sinônimos de desprezo ao caminho que
até aqui nos trouxe, muito pelo contrário, o diálogo entre estes pares talvez
seja o ponto de equilíbrio.
Considerando que estamos vivendo na
era da instantaneidade, onde tudo precisa e deve ser rápido, imediato, etc.,
onde a constante inovação substitui tudo e a todos como um rolo compressor,
como fica o pensar a longo prazo? Quais ingredientes não podem faltar em uma
proposta de projeto de vida pessoal, social ou organizacional?
Nunca a falta de domínio próprio ao
ser humano fez tantos estragos quanto na atual era da humanidade; grandes são os
níveis de ansiedade que assolam as pessoas, esta que talvez seja uma das ou a
doença do século tem feito muitas vítimas em todas as escalas de idade, ela não
perdoa crianças nem idosos, não respeita classe nem muito menos gênero. Um dos efeitos
avassaladores quando estamos sobre o controle da ansiedade é a ideia de que
tudo conspira contra nós, seja a vida natural ou as pessoas, inclusive dentro
de nosso próprio convívio familiar, religioso, profissional e etc. A
infelicidade, as frustações e as derrotas nunca foram antes tão fundamentadas
nos porões da ansiedade. Enfim, se algo está dando errado ou já não saiu como
planejado, a culpa é alheia, não de minha.
O mundo está desgovernado, os
índices de violência são assustadores, as autoridades militares que foram
instituídas para nos proteger tornaram-se o próprio crime; o que se houve
corriqueiramente é que o Estado precisa colocar mais policiamento, punir com
mais rigor o crime, construir mais presídios, impor pena de morte por crimes
graves cometidos, é a famosa política do medo. Será mesmo esta a solução, não
haveria um outro caminho menos custoso ao Estado e a sociedade como um todo.
Civilidade é o ideal humano para os
que vivem em sociedade, sabemos que o preço é alto a se pagar para se alcançar
plenitude civil, mas temos plena consciência que ainda é o caminho mais seguro,
mais curto e mais eficaz para combater os desajustes sociais enfrentados pela
comunidade global em maior escala nas periferias mundiais. É a única forma de
proteção que não distancia as pessoas umas das outras; ainda que sejamos
acusados de não sermos nós mesmos quando agimos civilizadamente, penso que seja
a melhor maneira de se conviver harmonicamente, pois despir-se dos meus maus
hábitos em favor do bem-estar comum é como utilizar uma máscara que possa
esconder a minha real condição, mas se é por uma boa causa penso fazer sentido
e ser válido.
Os espaços públicos possuem um
papel preponderante na homogeneização da sociedade, é neste espaço que as
individualidades são postas a prova e é neste momento que as políticas públicas
que dão equilíbrio as relações e garantem o direito universal de ir e vir que
fazem grande diferença. Sabemos que a coletividade tem um preço, se faz
necessário abrir mão de algo que talvez seja importante ou até mesmo
inegociável para alguns, no entanto notem que quando é dividimos estamos multiplicando,
outros usufruem semelhantemente a nós, já quando não cedemos ou abrimos mão do
nosso status quo, limitamos o benefício e o desenvolvimento harmônico da
comunidade.
Gostaria de chamar a atenção para
um aspecto muito sensível da atual era que vivemos ainda no contexto dos
espaços públicos, estou falando dos espaços construídos ou estabelecidos
socialmente como lugares de compras, consumo, lugares aonde se exerce uma falsa
liberdade. As mentes consumistas encontram nestes espaços o seu deleite, em
outros casos se derrama toda uma semana, mês, ano ou vida de frustrações quando
pelo simples ato de consumir se garante um falso sentimento de libertação e
realização. Para alguns há conforto pelo simples fato de sentissem aceitos em
uma comunidade ou grupo por ter exercido o direito de comprar o objeto tão
desejado que serve de símbolo de pertencimento a tais grupos.
De toda forma, fica o grande dilema
das relações, a todo tempo somos desafiados a optar por nos relacionarmos uns
com os outros abraçando-nos, respeitando-nos e juntos nos movendo ou nos
omitindo física e emocionalmente da realidade alheia. E o ambiente aonde tudo
isso ocorre é o ambiente público, aonde o viver urbano ocorre em suas diversas
formas. Não é muito difícil hoje em dia estar em lugares sem ser notado, ao
mesmo tempo que também não é impossível não notar as pessoas ou a realidade,
vale o esforço para tornar as experiências autenticas quando prestamos sentido
a cada momento independente do lugar.
A coisa mais comum nos grandes
centros hoje em dia é desenvolver um mapa mental limitado ao roteiro de uma
vida cotidiana, isso pode desenvolver um comportamento indiferente na sociedade
em geral, tanto aos que vivem em ambientes mais desenvolvidos, assim como, os
que vivem em ambientes mais precários de infraestrutura. A palavra que gostaria
de utilizar neste contexto é “esforço”, todos devem esforçar-se na direção de
ampliar os horizontes de convivência, tudo é válido, praticar assistência social,
atividades religiosas, educativas, dentre outras, quando se trata de criar vínculos
e encurtar distancias física e emocional. Não somos estrangeiros, somos
cidadãos de um país global, de uma aldeia.
Não existe um mundo perfeito, aonde
tudo funciona de forma harmônica e sincronicamente perfeito, as relações são
entre pessoas e não entre coisas, logo é mais do que natural que haja divergências
ideológicas e multiplicidade de comportamento. A modernidade nos desafia a todo
tempo, a sermos seres coletivos, diferentes nas ideias, mas homogêneos nas
decisões. Estamos construindo uma história que servirá de referência para as
gerações futuras e a cada tempo perdido com decisões individualistas que mais
nos separa do que nos une, mais tempo perderá a geração futura para construir uma
história de progresso linear.
Quando se trata de seres humanos,
vale a pena gastar tempo, vale a pena tocar a alma e sentir a essência da vida,
é preciso abdicar das ideias mercadológicas quando o assunto é gente. A maior
conquista na era da informação talvez seja a quantidade de diferença que iremos
fazer na vida das pessoas e não os territórios que iremos “conquistar”. Quando
se trata da vida humana, nada é perca de tempo, cada minuto investido no exercício
da cidadania é um fator determinante na melhoria da trajetória da sociedade.
A época em que quantidade de bens e
conquistas territoriais eram sinônimos de grandeza e superioridade ficou para
trás, como disse, o mundo é um país, a multinacionais não encontram mais
fronteiras, o capital transita livre e olhar apenas para o próprio umbigo hoje
é projetar um futuro trágico sócio economicamente, o mundo está assim, a
realidade é essa, vivemos na era do “face to face”.