Fonte: BONILLA, Maria Helena. Software livre e formação de professores: para além da dimensão técnica. In: FANTIN, Monica; RIVOLTELLA, Pier Cesare (orgs.). Cultura Digital e escola: pesquisa e formação de professores. Campinas, SP: Papirus, 2012.
Pensar
em ética e cultura hacker hoje significa uma quebra de paradigma. Aquele
conceito um tanto quando enigmático e pejorativo deu lugar a um conceito amplo
de democratização de acesso à tecnologia e ao conhecimento de forma ampla e
construtiva de tal forma que venha a engendrar capacidade e engajamento ao
sujeito do século XXI.
Imaginar
uma escola desarticulada no contexto das tecnologias digitais, sem usufruir de
suas potencialidades, é prever um futuro de certa forma comprometedor aos
cidadãos que dela necessitam para parte de sua formação educacional. A ética e
a cultura hacker na forma de uma tecnologia digital perpassam de forma
significativa pelas dimensões cultural, política e filosófica. A mensagem acima
de tudo subjetiva que a cultura hacker transmite é de uma insatisfação com o
modelo capitalista impregnado na sociedade, onde a ideia de colaboração,
criatividade e libertação dos padrões instrumentalistas excludentes são mais do
que nunca necessária.
No
entanto é importante reconhecer que as coisas não são tão fáceis assim.
Considerando a forma e o contexto das relações sociais presentes, onde as
amarras do capitalismo mantem-se hegemônico na condução das relações sociais e
vão padronizando a cultura ao seu modo de pensar e agir, chama-nos a atenção a importância
de uma ação coordenada, persistente e estratégica para se contrapor a esta
realidade hegemônica. Adotar o software livre apenas por adotar, sem um plano,
no caso da educação por exemplo sem a formação adequada para os professores,
isto é, sem formação continuada e ampla, assim como, ampliação do escopo de
acesso as tecnologias digitais na área educacional, é ter a certeza de que
diante das primeiras dificuldades haveremos de desistir, pois a ideia do difícil
e complexo manuseio do recurso é real, principalmente comparado com os modelos convencionais
ofertados pelo modelo proprietário.
As
práticas sociais enraizadas no capital estão postas, elas têm uma forma, uma característica,
que desde já afirmo, nada democrática nem muito menos colaborativa e de
bem-estar geral; resta-nos interpretar, identificar quais forças nos impede de mudar
esta realidade e propor teoricamente e na prática, meios de subjugarmos o que
nos oprime. Creio que uma dessas formas é o adequado e articulado uso da ética
e da cultura hacker.

As dificuldades são reais, mas no que diz respeito às dificuldades de operacionalização dos sistemas, elas existem tanto nos livres quanto nos proprietários. Claro, quando alguém já está familiarizado com um ambiente, enfrenta algum estranhamento quando muda para outro - e isso acontece até mesmo quando trocamos nosso smartphone, precisamos de um tempo para nos adaptarmos à nova interface, e tomamos isso como natural. No entanto, quando o tema é software livre, constrói-se um discurso de fragilidade dos sistemas, um discurso que faz parte de uma estratégia de desvalorização de todas as iniciativas contra-hegemônicas. É necessário evidenciar todos esses artifícios.
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