quarta-feira, 12 de junho de 2019

REFLEXÃO: Eu não sabia... eu era feliz!



Eu era só um menino que gostava de passar tempo no pequeno chão de terra que meu avô Manuel possuía nas proximidades da cidade de Ribeira do Pombal, estado da Bahia. Feriados, finais de semanas e o período de férias escolares eram certos que lá estaria; participando da rotina dos meus avós no campo. Moía o milho para fazer cuscuz, dava milho para as galinhas, colocava milho molhado para a égua branca de nome morena que meu avô tinha a muitos anos, apartava o gado juntamente com meu avô a partir das 16hs, sem esquecer de coloca-los para beber água em um tanque próximo ao curral aonde estes passavam a noite, enfim, eram dias maravilhosos, simplesmente inigualáveis, e assim tomei conhecimento de muitos saberes da vida no campo.

Fui orientado desde cedo que para ser gente eu tinha que saber das coisas, nossa e como procurei saber das coisas, hoje percebo que sei até de mais das coisas, mas quantas coisas eu não gostaria de saber, pois elas me trazem algumas lembranças tão estranhas que não gostaria de saber mais delas, gostaria que elas não mais existissem, mas elas insistem em fazer parte do meu saber, mesmo que eu não as convide para o meu pensamento.

Há outras coisas que sei que me trazem bons sentimentos, alegrias, regozijos, e como gostaria que eles sempre estivessem em minha mente tomando as 24 horas do meu dia, os sete dias da semana, os trinta dias do mês, ou seja, todos os dias da minha vida, mas estes parecem rebeldes e quando penso que não se vão, as vezes escondem-se e nos deixam sozinhos, parecem não serem nossos, se vão sem pedir licença e sem dizer adeus.

 Não poderia deixar de dizer que também há saberes que quero muito tê-los mesmo sem que tivessem me dito que deveria tê-los, eles simplesmente surgiram, talvez por contemplar as experiências de outros, por ter visto algo pela TV, por ter ouvido no rádio, por ter lido no jornal ou ter conversado com um estrangeiro, mas eles se parecem tão difíceis, as vezes tão impossíveis que nem sei mais se é interessante mesmo conhece-los, tê-los, desfruta-los.

Para que “saber” mesmo?

quinta-feira, 16 de maio de 2019

REFLEXÃO: Ética e Cultura Hacker





Fonte: BONILLA, Maria Helena. Software livre e formação de professores: para além da dimensão técnica. In: FANTIN, Monica; RIVOLTELLA, Pier Cesare (orgs.). Cultura Digital e escola: pesquisa e formação de professores. Campinas, SP: Papirus, 2012.



Pensar em ética e cultura hacker hoje significa uma quebra de paradigma. Aquele conceito um tanto quando enigmático e pejorativo deu lugar a um conceito amplo de democratização de acesso à tecnologia e ao conhecimento de forma ampla e construtiva de tal forma que venha a engendrar capacidade e engajamento ao sujeito do século XXI.

Imaginar uma escola desarticulada no contexto das tecnologias digitais, sem usufruir de suas potencialidades, é prever um futuro de certa forma comprometedor aos cidadãos que dela necessitam para parte de sua formação educacional. A ética e a cultura hacker na forma de uma tecnologia digital perpassam de forma significativa pelas dimensões cultural, política e filosófica. A mensagem acima de tudo subjetiva que a cultura hacker transmite é de uma insatisfação com o modelo capitalista impregnado na sociedade, onde a ideia de colaboração, criatividade e libertação dos padrões instrumentalistas excludentes são mais do que nunca necessária.

No entanto é importante reconhecer que as coisas não são tão fáceis assim. Considerando a forma e o contexto das relações sociais presentes, onde as amarras do capitalismo mantem-se hegemônico na condução das relações sociais e vão padronizando a cultura ao seu modo de pensar e agir, chama-nos a atenção a importância de uma ação coordenada, persistente e estratégica para se contrapor a esta realidade hegemônica. Adotar o software livre apenas por adotar, sem um plano, no caso da educação por exemplo sem a formação adequada para os professores, isto é, sem formação continuada e ampla, assim como, ampliação do escopo de acesso as tecnologias digitais na área educacional, é ter a certeza de que diante das primeiras dificuldades haveremos de desistir, pois a ideia do difícil e complexo manuseio do recurso é real, principalmente comparado com os modelos convencionais ofertados pelo modelo proprietário.

As práticas sociais enraizadas no capital estão postas, elas têm uma forma, uma característica, que desde já afirmo, nada democrática nem muito menos colaborativa e de bem-estar geral; resta-nos interpretar, identificar quais forças nos impede de mudar esta realidade e propor teoricamente e na prática, meios de subjugarmos o que nos oprime. Creio que uma dessas formas é o adequado e articulado uso da ética e da cultura hacker.


terça-feira, 7 de maio de 2019

REFLEXÃO: Tecnologia Assistiva



Fonte: BERSCH, Rita. Introdução à Tecnologia Assistiva. Assistiva.Tecnologia e Educação, Porto Alegre, RS: 2017.


Esta semana eu fiz duas grandes e significativas descobertas, a primeira foi sobre a diferença entre “solidão” e “solitude”, ou seja, percebi que sempre me confundia na hora de aplicar a palavra solidão para determinados contextos que na realidade se requeria ou se referia a “solitude”, e que ambas estão praticamente em sentidos opostos apesar de se utilizarem do mesmo “ambiente/situação”; mas enfim não é o caso da minha proposta reflexiva, portanto não gastarei mais tempo para conceituar ou descrever detalhes a respeito, o que quero é afirmar que a vida é uma constante descoberta. A segunda descoberta foi a respeito do objeto de reflexão desta reação, isto é, “tecnologia assistiva”, até então já havia presenciado situações e visto nas mídias algo relacionado, mas não tinha um conhecimento teórico a respeito.

Notem que em um determinado ponto do parágrafo anterior me refiro e vida como “uma constante descoberta”, desta forma, meu ponto de partida nesta reação é justamente esse movimento inerente a vida humana. Veja, em meu entendimento nenhum ser humano veio ao mundo, a despeito da situação física e ou cognitiva, para ser ou estar limitado ao que física ou cognitivamente a vida lhe impôs por alguma razão natural ou situacional intencional, ou talvez uma variável incontrolável. Incontestavelmente a dignidade é para todos, e o potencial da tecnologia assistiva neste contexto é expressivo.

A sensação de realização move a vida humana, me recordo de inúmeros casos pessoais desde minha infância até o dia de hoje, onde pude indescritivelmente sentir-me feliz e realizado por alcançar determinados objetivos de um simples check-list de tarefas, ou seja, ter a sensação de que podemos alcançar algo mesmo estando limitados física ou cognitivamente é estupendo.

Aquilo que é impossível para alguém com deficiência, torna-se possível por meio das tecnologias assistivas e naturalmente um novo mundo se apresenta para os que até então foram limitados pela falta da tecnologia em si ou até mesmo pela falta de interesse dos que lhes rodeiam. Sim, vejo uma infinidade de possibilidades de proporcionar dignidade por meio dos recursos da tecnologia assistiva aos que estão limitados por uma deficiência, mas vejo também vejo um universo de impossibilidades quando me omito de ser o condutor, a ponte que ligará o necessitado a sua realização pessoal. A tecnologia está aí para transpor os limites mais complexos, mas a disposição humana dos que estão em melhores condições de que outros é uma condição sine qua non para que haja materialidade.

Independência, qualidade de vida e inclusão social são possíveis sempre que nos propomos a sair da nossa zona de conforto e, como auxilio podemos dizer que hoje temos a tecnologia assertiva para fazer frente a esta grande obra de emancipação dos que possuem uma deficiência que os limitam em seu processo desenvolvimento físico, intelectual e social.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

REFLEXÃO: Políticas públicas de educação e TIC




Fonte:
BONILLA, M., PRETTO, N. - Política Educativa e Cultura Digital, Entre Práticas Escolares e Práticas Sociais;
BONILLA, M., PRETTO, N. - POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EDUCAÇÃO E INFORMÁTICA;
TIRAMONTI, Guillermina - Escuelas PROA;
Velasquez Gavilanes, R. - 2009 - Hacia Una Nueva Definición


Ao que parece, as práticas sociais do presente século são dadas majoritariamente no contexto da cultura digital, ou seja, as relações econômicas, profissionais, acadêmicas, políticas, etc., quando não plenamente estão dentro deste contexto, pouquíssimos fatos ainda ocorrem fora dela, aspecto que torna a cultura digital uma realidade social na qual jugo ser importante conhecer os elementos que fazem parte da mesma, agregar as devidas competências para transitar dentro dela, assim como, formar senso crítico equilibrado para julgar o que dela será agregador ou desagregador no tocante a cidadania.

Neste sentido fico refletindo sobre os alunos do sistema escolar brasileiro que estão sendo preparados pela escola para ser os cidadãos de amanhã, ou seja, recebendo as contribuições da escola para sua emancipação. A ausência das políticas públicas educativas que potencializem o processo de emancipação desse sujeito passa a ser um fator preponderante para uma formação deficitária, pois é notável que a realidade social brasileira é desigual e a classe mais pobre economicamente necessidade de maior atenção por meio das políticas públicas sociais, ou seja, enquanto os alunos que possuem melhor condição social, recebem um ensino e uma estrutura apropriada para prepara-lo para a realidade atual, o indivíduo da escola pública pena para performar de maneira satisfatória frente aos desafios acadêmicos que lhe são impostos pela cultura impositiva tradicional enraizada no sistema escolar público brasileiro.

Não basta querer fazer política pública educacional apenas por fazer e “sair bem na foto”, é preciso fazer de forma articulada, comprometendo os diversos setores governamentais e agentes políticos e sociais potencialmente capazes de contribuir com tais políticas. A história nos mostra inúmeros projetos e programas que acabaram sem alcançar os resultados previstos, outros sequer puderam ser avaliados os resultados, pois foram extintos ainda no meio do processo de implementação, o que fica evidente a falha no processo de implantação e gestão. Um outro olhar também pode ser lançado por exemplo no contexto do professor, que não recebe a devida atenção e quando diante dos projetos de cunho tecnológicos se veem inoperantes diante de uma dinâmica estranha a sua formação e atual condição técnico-profissional. A articulação que menciono acima passa também pela inclusão deste que é peça estratégica e fundamental para o sucesso das políticas públicas educacionais, sejam elas de cunho tecnológico ou outro qualquer que ocorra no seio escolar. A formação continuada é uma condição sine qua non para a adaptação do professor as novas convergências, assim como, para o sucesso dos projetos e programas decorrentes das políticas educativas, são por meio dela que se diminuem as distancias percorridas entre o ponto de partida e o ponto de chegada dos objetivos estabelecidos, e acima de tudo da emancipação do aluno como maior deles.

Por fim, é essencial também preparar a escola para o processo de mudança, de convergência, de promotora da cultura digital, ou seja, não basta adquirir caminhões carregados de equipamentos tecnológicos e os descarregarem em uma sala que ficará fechada a sete chaves aguardando a boa vontade de alguém para dar destino aos mesmos. A educação não aceita a gestão do “faz de conta”, ela cobra quando não é conduzida com o devido cuidado e atenção; se tem equipamento tecnológico, logo é essencial que se tenha boa internet, caso contrário o destino é a obsolescência; se investiu em infraestrutura pesada é preciso torná-la funcional ou então teremos “elefantes brancos” espalhados pelas áreas da escola que servem mais de “cartões postais” para selfs dos alunos do que meios que auxiliam no processo de ensino e aprendizagem.

Mais do que inconveniente, penso que seja imoral conduzir o sistema público de ensino fora da proposta de preparar o aluno para atuar de forma plena na era da cultura digital. Pensar e agir diferente dessa proposta é decretar a sua permanência na atual condição socioeconômica e sem possibilidades algumas de sonhar e lutar por uma experiência até então nunca vivida, senão apenas contemplada na vida de outros que foram melhores atendidos por suas heranças familiares e de políticas públicas hegemônicas direcionadas ao bem-estar de uma classe só, certamente não a que mais necessita delas.


terça-feira, 16 de abril de 2019

REFLEXÃO: Convergência




Fonte: SANTAELLA, Lucia. Comunicação ubíqua, repercussões na cultura e na educação. São Paulo, Paulus, 2013. Cap. 11



A transição da “realidade social analógica” para a “realidade social digital”, impõe alguns desafios aos atores desse contexto, tais como absorver e adaptar-se a essa nova realidade de maneira tal que não sejamos e não nos sintamos ultrapassados nesta nova ordem mundial.

Tudo passou a sofrer influência das tecnologias digitais, saúde, segurança, trabalho, educação, etc.; ainda há aspectos que podem ser considerados “analógicos” no cotidiano da humanidade, mas é cada vez mais evidente uma forte convergência para uma realidade cada vez mais digital. Acredito que ambas as realidades conviverão juntos por muito tempo, no entanto sou levado a pensar com base em algumas experiências pessoais, de que nos dias de hoje é impossível atuar em uma das áreas mencionadas acima, apenas dominando os padrões analógicos humanizados, pois muito das burocracias e processos destas áreas são hoje operadas via um elemento digital.

A ideia de emancipação do sujeito no contexto analógico não necessariamente se aplica ao contexto da realidade digital. A convergência de uma realidade para a outra impôs algumas mudanças naturais a este conceito e processo, é como se o cidadão politicamente emancipado de 30 anos atrás tivesse que correr atrás para se adaptar e agregar novas formas de atuar na era das tecnologias digitais para manter-se emancipado, pois na medida em que a maior parte das relações sociais se dá sob a influência desta se faz necessário estar inserido para exercer sua influência e ter voz ativa politicamente.

O ponto de reflexão que gostaria de levantar é a respeito dos limites e reais necessidades de convergir junto com a realidade social, ou seja, até onde se faz necessário acompanhar este processo, o que é saudável e ao mesmo tempo emancipador ou não. É uma questão de ser feliz, de necessidade ou de ambos aspectos? Há algumas contradições, aposto que se eu perguntasse para meu avô Gabriel Cassiano(falecido de morte natural aos 102 anos no ano de 2016) no auge dos seu 95 anos de idade, o que ele achava de portar um celular todas as vezes em que se deslocasse para a mata montado em sua mula para tocar suas atividades agrárias, a fim de que a nossa familia pudesse localiza-lo com maior facilidade caso houvesse alguma acidente, ele certamente diria que essa ideia era uma tremenda de bobagem, pois um sertanejo não precisa dessas invenções dos mais jovens que vivem na cidade grande. Para ele o conceito de felicidade e necessidade se resumia ao seu território agrícola, rodeado dos seus “companheiros” (gado, cabra, ovelha, cavalo, mula, galinhas, pássaros, etc.,), da familia e da comida típica da região. É uma forma simples e básica de tocar a vida, porém bastante provocadora para nós que vivemos na cidade grande emergidos na realidade social digitalizada.

É interessante notar que ao lado do pedaço de terra que meu avô possuía, havia uma familia que tinha trocado a mula, o cavalo e o jumento pela motocicleta, segundo eles esta era uma forma mais eficaz de tocar o gado ao final do dia quando o sol se punha, assim como, uma forma mais rápida de ir até a cidade para resolver demandas pessoais de diversas ordens. Notadamente aqui temos um contraste em praticamente o mesmo espaço, dividido apenas por uns cerca de 7 arames. Isso nos faz refletir o quão é relativo algumas questões que giram em torno do bem-estar humano, o que para alguns é uma necessidade, uma questão de sobrevivência, para outros não passa de “uma invenção do homem da cidade”, que não tem mínima influencia em seu padrão de vida e nem muito menos em seu projeto de vida futuro.

Enfim, considerando as devidas realidades, cabe a nós ponderar a real necessidade de adaptação e inserção dos elementos digitais em nossa realidade pessoal em qualquer área em que estejamos inseridos em um determinado momento da vida. É importante entender que uma coisa não necessariamente suprime a outra e que haverá momentos em que a depender das circunstâncias teremos que está plenamente engajado na “realidade digital” e ou na “realidade analógica”, e em outros momentos teremos que estar transitando em ambas simultaneamente, penso que tudo vai depender das nossas prioridades estabelecidas para o momento presente.

segunda-feira, 8 de abril de 2019

REFLEXÃO: Narrativa e temporalidade na cultura midiática



Fonte: FOLLAIN, Vera. Narrativa e temporalidade na cultura midiática. Tríade, Sorocaba, SP, v. 5, n. 9, p. 128-139, jun. 2017.



Quando criança, lembro de que gostava de ouvir histórias de todos os tipos narradas pelo meu avô e pelo meu irmão mais velho. Recordo-me que sempre tive uma pré-disposição para o ouvir, até hoje percebo que muito me satisfaz ouvir o que as pessoas têm a dizer, independente do que seja, percebo que é como um dom natural que recebi da Deus. A minha imaginação fluía e flui com as histórias narradas; costumava viajar além-mar, cruzar fronteiras, me imaginar em lugares distintos, criar imagens de pessoas, animais, lugares e objetos com muita facilidade e agilidade.

Algumas histórias me marcaram nesta aventura da imaginação proporcionada pelas narrativas do meu avô Manuel Araujo (falecido em 2017, aos 92 anos) e do meu irmão Nadson Cassiano (irmão mais velho). Sou um cidadão de origem humilde, simples, um homem do campo, toda minha familia veio do campo, tanto meu avô, assim como, meu irmão mais velho tiveram a oportunidade de visitar a “cidade grande”, por necessidades médicas e pessoais de ordem profissional; sempre quando possível ambos gostavam de me narrar suas experiências na “cidade grande”, ainda que algumas vezes de forma repetida (risos...), mas enfim, foram válidas; o fato é que em decorrência da influência dessas histórias, desenvolvi alguns sonhos que com o passar do tempo se tornaram metas pessoais, tais como, conhecer a cidade grande, viajar de avião, viajar de trem, morar em um apartamento em um prédio de 12 andares, andar de elevador, conhecer um shopping center e andar de escadas rolantes, conhecer o mar, andar na areia da praia, dentre outros. Em contrapartida, como mencionei acima, houve uma situação que me marcou negativamente, ou seja, tanto meu avô quanto meu irmão adoravam me contar histórias que podemos aqui chamar de lendas e mitos regionais, tais como, “lobisomem”, “mula-sem-cabeça”, “encruzilhadas com pessoas falecidas e presas no tempo”, dentre outras tristes e dramáticas; em decorrência disso, percebi que os medos e suspenses oriundos destas narrativas me acompanharam ao longo da vida e algumas delas me traumatizaram, como por exemplo, não costumo me sentir bem quando tenho que participar de um funeral de quem quer que seja, assim como, permanecer em ambientes escuros, etc.

Bom, de certa forma fica claro para mim com base nas minhas experiências, a importância do uso da imaginação principalmente quando se trata daquelas oriundas das narrativas de todas as formas, sejam elas contadas por uma pessoa, por um jornal, um livro, ao vivo, no rádio ou na tv. As narrativas têm seu valor e assim como em todos os aspectos da vida, se faz necessário o devido uso e a adesão da responsabilidade, sabendo que tudo o que se narra alcançará um canal condutor e um receptor e naturalmente exercerá influencia e consequentemente se plantará uma semente.

A minha filha de 4 anos de idade, assim como eu possui grande disposição para ouvir, ela ama ouvir histórias todos os dias, tanto pela manhã como antes de dormir, em minha casa é uma regra pelo menos duas vezes por dia sentarmos e contarmos histórias bíblicas e da literatura para ela, eu e minha esposa nos reversamos nesta tarefa. Mas percebo que há uma inclinação muito forte da minha pequena filha para as questões que envolve TV e Smartphone, e creio que grande parte desta inclinação é em decorrência da nossa influencia como pais que consumimos estes produtos em sua presença. A experiência que posso contar sobre este contexto se deu no início deste semestre, ou seja, todos os dias tenho que levar e pegar minha filha na escola e nos momentos em que tenho que retornávamos para nossa casa, ocorria que eu entregava meu smartphone para ela vir assistindo, e assim eu conseguia fazer com que ela ficasse tranquila na cadeirinha do carro e não teria certo stress no trajeto, com isso, podia ouvir uma música tranquilo e chegar bem para o almoço. Ocorre que com o passar dos dias percebemos que nossa filha ficou viciada com os conteúdos oriundos da internet e seu comportamento também mudou, infelizmente foi uma mudança negativa, seu vocabulário ganhou novas palavras até então desconhecidas da gente, enfim, a experiência não foi muito positiva, tivemos que intervir e isso gerou um certo desgaste; a partir daí elaboramos um plano de desconstrução do que foi desenvolvido negativamente pelo contato com as narrativas oriundas da internet no smartphone e na tv, organizamos melhor o tempo de consumo da internet dela e selecionamos melhor as categorias de conteúdo, assim como, passamos a estar 100% presentes nestes momentos de interação. Hoje ela não mais retorna para casa comigo da escola com o smartphone na mão, sempre voltamos conversando sobre o que ocorreu na escola e sobre algumas questões da nossa realidade familiar, com isso foi possível contornar o problema.

Por fim, concluo afirmando que as narrativas possuem grande poder de influência, o advento e inclusão das imagens demandaram um certo empobrecimento das mesmas e deram origem a uma maior degradação da sua influência para quem a recebe. Por outro lado, uma vez que seja bem canalizado e haja acompanhamento, tem potencial substancial para ser agregador a cultura e a vida como um todo. A modernidade é importante no contexto da emancipação humana, o homem deve acompanhar o progresso técnico sem que necessariamente abandone as práticas fundantes que nos tornam cidadãos civilizados. O progresso técnico e cientifico deve potencializar nossas relações sociais, não devemos nos deixar cegar diante das novidades e possibilidades engendradas por tal progresso, muito pelo contrário, é preciso manter a ética e reconduzir o que está tomando rumos morais e sociais insustentáveis. Ao mesmo tempo que os aspectos tecnológicos não devem suprimir os elementos essenciais da narrativa, este deveria ser agregado ao processo de modernização da emancipação humana, falo de um processo de complementação e não de divisão e supressão daquilo que é agregador e foi positivo na trajetória humana até hoje.  

sábado, 30 de março de 2019

REFLEXÃO: Ciberespaços e tecnologias móveis



Fonte: Ciberespaço e Tecnologias Móveis. Processos de Territorialização e Desterritorialização na Cibercultura - André Lemos



A reflexão que faço sobre o texto gira em torno da excessiva racionalização do homem na busca do controle sobre as movimentações sociais da humanidade. Seja desterritorializando ou reterritorializando; fica evidente a presença intrínseca e em alguns casos explicita da ação do homem em controlar os espaços habitados pelo seu semelhante, seja ele físico ou o ciberespaço da cultura digital. A globalização tem imposto a vida humana um processo natural de migração para os ciberespaços como forma de vida e engajamento, seja social, profissional, acadêmica etc. A pergunta a se fazer é o quanto é necessário e quais os limites desse processo de territorialização, assim como, quais os interesses por trás desta pressão social para se colocar na rede.

Tudo é muito sutil, os mais diversos dispositivos digitais com os quais dividimos o nosso dia a dia, ou até mesmo os utilizamos para conduzir a nossa vida são também instrumentos de mapeamento do nosso perfil social quando registram nossas buscas por algo a ser consumido, ou nos auxiliam em nossos deslocamentos e interações diversas. O autor se refere a este processo como “marcas eletrônicas deixadas na rede”, as quais servirão de base para algo ou alguém em algum lugar seja perto de nós ou a milhares de quilômetros daqui.

Não importa aonde estejamos, seja aqui ou em outro continente, como adeptos da cultura digital, se estivermos dentro do ciberespaço será sempre possível controlar-nos. Neste contexto, os dispositivos digitais ao mesmo tempo que servem como instrumentos que nos auxiliam a superar as barreiras geográficas, as cidades e as fronteiras, logo um instrumento de reterritorialização, passa a ser um elemento chave de controle social.

O ciberespaço tem a capacidade de ao mesmo tempo em que desterritorializa, consegue reterioalizar, e isso vale para os níveis político, econômico, social, cultural e subjetivo. A questão que levanto é justamente os efeitos engendrados desse processo na realidade social existente. A minha grande preocupação passa pela concepção que possuo a respeito da cultural digital ser na maioria das vezes sem limites, a impressão que tenho é que os ciberespaços não levam em consideração os valores pré-existentes no contexto político, econômico, social e cultural e, com isso tende a proporcionar percas irreparáveis na medida em que exerce sua influência.

Tenho consciência da natural pré-disposição do homem em movimentar-se para conquistar e estabelecer-se frente a realidade de que lhe é imposta, mas me preocupo se este está em condições de assumir o controle de todo o processo de desterritorialização e reterritorialização de forma autônoma, veja, T. Hobbes em sua obra clássica “O Leviatã” afirma em outras palavras que “o grande problema da humanidade surge quando o homem resolve pregar uma estaca de madeira ao solo, demarcando um espaço e declarar que a partir de então aquele ambiente era de sua propriedade”; desta forma sou levado a pensar nos desdobramentos propostos pela cultura digital por meio dos ciberespaços.

No verão de 2017, estive em duas cidades espanholas com vistas a conhecer um pouco mais da cultura daquele país. Algo curioso me aconteceu na cidade de Barcelona ao sair de uma determinada estação de metrô e me deparar com dezenas de imigrantes, cidadãos africanos, aparentemente falando o mesmo idioma/dialeto, vestidos basicamente de forma igualitária, cada um possuindo uma espécie de lençol branco que estava dobrado de uma forma particular de maneira tal que ganhava um formato de bolsa ou sacolão aonde eles carregavam ali dentro uma série produtos de diversas características; todos estavam juntos na saída desta estação, sentados a sobra em um dia escaldante, de “forte sol”, cantavam e pareciam se comunicar de forma assertiva naquilo que parecia um dialeto peculiar da sua região de origem. Aquela situação me chamou a atenção, sentei-me a uma certa distância e passei a observa-los, logo percebi que eram africanos do norte do continente por causa de algumas bandeiras típicas que carregavam consigo dos países norte-africanos, notei também que praticamente todos carregavam consigo um smartphone, e vez ou outra se alto registravam como que se estivessem fazendo um self ou até mesmo comunicando-se com sua familia, amigos ou país de origem ou com pessoas de qualquer outra parte do mundo. O que ficou evidente para mim foi que não se tratavam de turistas, pois haviam policiais que os cercavam a todo tempo e a cada movimento individual ou em grupo, estes recebiam “atenção” daquelas autoridades militares, enfim, eram imigrantes que estavam fisicamente e no ciberespaço em meio a tensões sociais procurando a luz da cultura digital, desterritorializar e territorializar.

Bom, precisei seguir meu caminho e alguns dias depois me desloquei até a capital espanhola (Madri), e no percurso que fiz de trem, tomei um periódico para ler e fui surpreendido com uma entrevista de um líder africano de um determinado movimento de apoio a imigrantes africanos, que não só apoiava este movimento, mas combatia toda e qualquer violência física e ou emocional causada pelos países da união europeia aos que estavam segundo palavras deste líder, “apenas tentando recuperar(ou talvez reterritorializar-se no contexto da cultural digital) de forma pacifica a riqueza que um dia os europeus de forma brutal lhes saquearam”. Aquelas palavras me chamaram bastante a atenção e fiquei refletindo sobre os reais interesses por trás da cultural digital ao promover todo este movimento de emancipação do homem no âmbito dos ciberespaços. Aquilo que um dia foi primariamente por meio de navios no contexto do continente Africano e da Europa, hoje ganha mais um possível aliado por meio dos ciberespaços.

Bem, chegando em Madri, resolvi tirar um dia para caminhar pelo centro histórico da cidade, e em um determinado momento ouvi uns gritos e uma pequena correria me despertou, procurei um lugar “seguro”, pois se tratava de uma variável não muito comum para os padrões daquela cidade, mas ao mesmo tempo me pus a observar o que estava acontecendo, percebi que se tratava de dois policiais que enquadrara um imigrante africano acusando-o de furto, a multidão observava a cena e passados alguns poucos minutos logo se dispersara, tomei meu caminho e desci uma avenida no sentido do “Museo Del Prado”, ao qual pretendia visitar naquela tarde, foi quando me deparei com alguns destes imigrantes com suas mercadorias estendidas em cima de um lençol branco em frente a uma estação de metrô e resolvi me dirigir até um deles, foi quando percebi que vendia camisa de times de futebol, comprei uma camisa do Barcelona(clube tradicional da Espanha), e aproveitei para construí um diálogo a partir daquele momento; perguntei coisas do dia a dia, tais como, sobre a familia, futebol, amigos, comida, e finalmente sobre seu país de origem, cidade/aldeia ou tribo de origem; notei que a todo tempo o jovem com o qual desenvolvi um diálogo comunicava-se com outros que ali estavam a poucos metros e espalhados por toda a avenida por meio do smartphone, creio que utilizando a mídia social Whatsapp ou uma outra similar, e percebi que esta atitude era uma espécie de estratégia de proteção aonde eles avisavam uns aos outros a respeito de tudo o que ocorria no raio de presença deles de forma que parecia uma forma de “controlar” a situação e assim nada de ruim pudesse lhes acontecer; logo tive a sensação que o que ocorrera antes no início dessa avenida, talvez tenha acontecido por conta que aquele imigrante se separara do grupo ou quem sabe se descuidara se deixando levar pelo desejo de algo que não lhe pertencia a ponto de tentar se apropriar de forma indevida, conforme anunciara em alta voz os policiais naquele momento.

Dentre as muitas lições que tiro desta experiência, uma das que mais me choca é que perdemos a capacidade de convivência coletivamente, de amar, de respeitar, de valorizar a vida humana. Para mim, sempre fomos uma aldeia global, um mesmo povo, apenas estávamos separados fisicamente por consequência da pré-disposição de conquista quando resolvemos “ganhar o mundo” transpondo os limites da terra, em busca de novas aventuras tendo como pano de fundo o desejo pela conquista, pelo que é novo. Com o advento da globalização (particularmente penso que em grande parte decorrente do progresso intelectual do ser humano), a qual considero como o processo de reagrupamento natural decorrente daquilo que um dia foi homogêneo mentalmente e fisicamente, simplesmente desconsideramos tudo e passamos a nos enxergar como opositores territorialmente e ideologicamente, logo também socialmente. A nossa pré-disposição em conquistar o ainda não conquistado ganha novos ingredientes, ou seja, já que nos encontramos novamente como povo, prevalece o meu pensamento, as minhas ideias, as minhas vontades, a minha forma de vestir, a minha cor, a minha cultura, os meus modos, enfim, se não forma da forma como eu penso, não podemos conviver pacificamente, logo “é melhor que o outro não exista”; se a realidade não for pautada pela minha cultura, minha política, minha economia, meus costumes, meus produtos, não haverá harmonia. De outra forma, não haverá ordem mundial na grande aldeia mundial gerada pela globalização, seja no território físico tal qual conhecemos, seja nos ciberespaços.